Primeiro brasileiro campeão da Euro, Marcos Senna relembra Luis Aragonés e a carreira na Espanha
Serão sete brasileiros na Eurocopa que começa nesta sexta-feira. Jorginho, Rafael Tolói e Emerson Palmieri foram convocados pela seleção italiana, enquanto Mário Fernandes defenderá a Rússia, Marlos mais uma vez foi chamado pela Ucrânia e Thiago pela Espanha - com a ressalva de ter nascido na Itália, mas ter sido elegível para a seleção brasileira no passado. O último deles é o único que já levantou a taça da Euro, o zagueiro Pepe, por Portugal, que, no entanto, não foi o primeiro brasileiro a conseguir esse feito.
Em 2008, já consolidado no meio-campo do Villarreal após se transferir do São Caetano, Marcos Senna foi campeão europeu com a Espanha. Titular indiscutível na equipe do técnico Luis Aragonés, foi considerado por muitos o melhor jogador do torneio, superior inclusive a Xavi, eleito pela UEFA. As lembranças daquele 29 de junho de 2008 ainda estão muito vivas na memória do, agora, diretor de Relações Institucionais do Submarino Amarelo desde 2015. Principalmente os momentos anteriores à vitória por 1 a 0 sobre a Alemanha.
"O Luis Aragonés era especial, aquele estilo de treinador capaz de convencer o jogador a fazer o que ele quer. Acho que a função do treinador é essa, obviamente ele precisa saber da parte tática, mas ter o time na mão é o mais difícil. Ele sempre contava alguma piada para a gente relaxar. Na final contra a Alemanha, começou a errar alguns nomes, chamar o Schweinsteiger de Bastinteiger, o Ballack de Wallace. Eu estava bem centrado, bem concentrado na preleção dele, mas em uma situação como essa não tem como! Todos os jogadores riram muito. Risos e nervosismo, acabou tendo um equilíbrio. Assim fomos mais relaxados para a final", lembra Marcos Senna.
A trajetória do meio-campista com a Fúria começou dois anos antes e incluiu o Mundial. Tudo graças ao desempenho em campo pelo Villarreal e a vontade de Luis Aragonés. "Jamais na minha vida imaginei jogar por uma seleção que não fosse do meu país de origem. Meu sonho era atuar na seleção brasileira, mas as coisas surgiram e foram acontecendo muito rápido. Para a Copa de 2006 já tínhamos uma seleção brasileira formada, com grandes figuras. Eu jogando no Villarreal, ainda desconhecido... Quando veio o Luis Aragonés falar comigo, não pensei duas vezes. Era a possibilidade de jogar uma Copa do Mundo. Foi uma experiência incrível, quatro anos fantásticos e grandes amizades".
O início de toda essa história foi muito marcante não apenas para o jogador brasileiro, mas também para a própria Espanha. A primeira convocação de Marcos Senna foi a primeira também de Andrés Iniesta e Cesc Fàbregas. "Meninos novinhos, já eu estreei com 29. O Luis Aragonés, no vestiário, falou para todos que quem tinha 100 jogos ou estava chegando, era tudo igual. 'Trato todos iguais'. Os jogadores naturalmente já o conheciam, havia muito respeito por ele, e sabiam que, se pisassem fora do lugar, ele não pensaria duas vezez em puxar a orelha". A forma de trabalho do treinador, que faleceu em 2014 aos 75 anos, foi determinante para a total adaptação do brasileiro ao elenco. "Cheguei e senti essa confiança, que ele era neutro, queria apenas o bom trabalho do grupo. Ele me colocou para jogar e os jogadores me trataram super bem".
Presente e história no Villarreal
Como diretor de Relações Institucionais do Villarreal, Marcos Senna possui agenda movimentada. Sua conta no Instagram apresentam os registros fotográficos que comprovam isso. Está presente em eventos com torcedores, compromissos com entidades ou no cotidiano time principal. Hoje, o clube da pequena Vila-real, com cerca de 50 mil habitantes na Comunidade Valenciana, possui tamanho e organização superiores a tudo que ele viu em 2002, quando foi contratado. E Marcos Senna conhece muito bem o principal responsável por essa transformação.
"Tive o privilégio de pegar o clube nesse crescimento e participar desse processo. O presidente Fernando Roig é o nome principal de todos esse projeto. Chegamos a um patamar que muitos não acreditavam que chegaríamos, um clube de uma cidade pequena, mas o presidente desde o início teve essa convicção, de manter o clube na primeira divisão e chegar na Europa. A princípio todos acharam que era um fanfarrão, mas foi tudo ao contrário. O Villarreal teve um crescimento enorme", conta Marcos Senna. Fernando Roig possui fortuna estimada em US$ 1,4 bilhão de dólares. É proprietário da rede de supermercados Mercadona na Espanha e assumiu o controle do Villarreal na temporada 1997-98, na segunda divisão.
Outro nome extremamente importante no crescimento do clube e estabelecimento como uma das principais forças do futebol espanhol neste século foi Manuel Pellegrini. O técnico chileno comandou o Submarino Amarelo de 2004 a 2009 e esteve à frente na histórica campanha semifinalista na Champions, em 2006. Foi determinante também na formação do próprio estilo da equipe. "O Villarreal é um clube com uma metodologia a ser seguida, uma referência. Jogadores e treinadores contratados vêm com o perfil marcado. O clube tem um sistema de jogo de toque, sair jogando desde a defesa, não tem o estilo do chutão. Geralmente os jogadores precisam se encaixar nesse padrão. Não buscamos, por exemplo, aquele tipo de centroavante alto, batalhador, e sim atacantes que se encaixam nesse perfil", explica Marcos.
Há ainda alguns aspectos que apenas as pessoas que viveram intensamente o Villarreal nas duas últimas décadas podem descrever. "O pessoal aqui é muito apaixonado por futebol. Não sei se é mais ou menos que no Brasil, mas perder não perde. Nosso estádio tem capacidade para 24 mil torcedores, temos 20 mil sócios que dificilmente perdem jogos. A torcida está cada vez mais apaixonada. Antigamente era uma torcida mais calada, que não cantava tanto, e hoje vejo uma geração de meninos que tinham oito, dez anos na minha época de Champions, que mudou bastante. Já dá para ouvir a torcida no estádio".
Ida para a Espanha
Um detalhe curioso e pouco divulgado sobre a carreira de Marcos Senna, revelado pelo Rio Branco, de Americana, no interior de São Paulo, envolve sua chegada ao Villarreal. Em 2002, o clube fechou com Gilberto Silva, que estava no Atlético Mineiro. Os espanhóis, no entanto, apenas acertaram com o volante da seleção brasileira verbalmente, sem assinatura de contrato. Com o destaque obtido pelo jogador no Mundial e o título conquistado, o Arsenal se interessou pela contratação e acabou levando o jogador para Londres. Isso obrigou o Villarreal a buscar outro meio-campista e, "por acaso", achou no Brasil.
"O vice-presidente veio atrás do Somália, atacante. Acho que o Somália nem sabe disso. Assistiram as semifinais contra o América, no México, e eu acabei fazendo um ótimo jogo. Já o Somália não apareceu, estava super bem, fez um ótimo campeonato, mas a partir daí surgiu o interesse. Depois foram ao Brasil já exclusivamente para falar comigo no dia anterior à final da Libertadores". Nessa época, já como volante graças a Oswaldo de Oliveira. "Fui contratado pelo Corinthians para jogar como meia. Na estreia do Brasileiro de 1999, contra o Gama, surgiu um imprevisto com o Vampeta, que teve que ir para a seleção. Com isso o Oswaldo me recuou para jogar ao lado do Rincón e fui super bem. Eu gostei, porque não recebia bola de costas, prefiro jogar de frente".
Hoje em dia Marcos Senna mora com a família em Valência, ao lado de Vila-real, onde trabalha. Jamais esqueceu suas raízes, mas criou mais algumas muito fortes em território espanhol. Estará na torcida pela seleção espanhola nesta segunda-feira, na estreia contra a Suécia pela Eurocopa.
Primeiro brasileiro campeão da Euro, Marcos Senna relembra Luis Aragonés e a carreira na Espanha
COMENTÁRIOS
Use a Conta do Facebook para adicionar um comentário no Facebook Termos de usoe Politica de Privacidade. Seu nome no Facebook, foto e outras informações que você tornou públicas no Facebook aparecerão em seu cometário e poderão ser usadas em uma das plataformas da ESPN. Saiba Mais.