Fergus Suter: como o túmulo do primeiro jogador profissional da história foi ‘resgatado’
Os primórdios do futebol foram relembrados durante o período da pandemia de coronavírus, com "The English Game”. A minissérie lançada pela Netflix em 2020 mistura fatos com ficção e tem como personagem central Fergus Suter, que é reconhecido como o primeiro jogador profissional da história do futebol embora não se tenha uma prova sólida que corrobore isso.
Além de resgatarem e fantasiarem o início do esporte mais popular do planeta, os seis episódios ajudaram, indiretamente, a restaurar o próprio jazigo do pioneiro entre os profissionais do futebol.
“O túmulo do Fergus Suter era conhecido, as pessoas sabiam que estava lá, mas ninguém fez nada por isso. Se algo não fosse feito, teria desaparecido no chão”, contou ao blog Jacqueline McAleese, que vive há mais de 20 anos no Blackburn Old Cementery, justamente onde estão os restos mortais do pioneiro jogador de futebol.
Jacqueline até torce para o Blackburn Rovers, mas não é uma grande fã de futebol, o que não impediu que a história por trás do túmulo a impactasse. Até porque tratava-se de algo que ‘batia a sua porta’ e que transcendia o esporte.
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Jacqueline passa cerca de cinco vezes por semana em frente ao túmulo de Suter, e o cenário de lockdown fortaleceu essa rotina. “Durante o lockdown nós andávamos muito pelo cemitério, porque era isso o que podíamos fazer, não podíamos ir a qualquer outro lugar”.
Assistir a uma série e fazer caminhadas em locais próximos de casa foram atividades muito comuns no mundo inteiro em meio ao período de isolamento, mas, além de manter a saúde, seja mental ou física, tal combinação acabou trazendo um propósito ainda maior a Jacqueline.
“Este túmulo iria desparecer no chão, e ele deveria ser lembrado e mantido para torcedores de futebol de fato serem capazes de visitá-lo e relembrar o homem que tornou o futebol profissional.”
Foi então que o trabalho dela começou.
“Levou umas boas três semanas para tirar completamente o monte de grama que tinha para tornar em uma área que parecia um túmulo. Uma vez que chegou a este ponto, eu tinha feito muita pesquisa sobre Fergus Suter e estudei exatamente sua importância”, contou Jacqueline.
Uma das primeiras coisas que ela encontrou em seus estudos certamente foi que Suter se tratava de um jogador escocês contratado pelo Blackburn Rovers em 1880 e que ficaria por nove anos no clube. O atleta esteve nos três primeiros títulos do Blackburn na FA Cup em 1884, 1885 e 1886 e somou três gols em 38 jogos da Copa da Inglaterra, além de ter atuado uma vez na edição inaugural do Campeonato Inglês em 1888-89.
O pioneirismo de Fergus se deu em um momento em que o futebol ainda era amador e não era permitido ganhar dinheiro à época com sua prática.
“Ele apenas trabalhava algumas semanas então jogava futebol por dinheiro. Ele era pago de forma discreta, porque era ilegal”, disse o historiador Andy Mitchell, conforme publicado pelo jornal Mirror em março de 2020.
Outro aspecto interessante é a influência escocesa no futebol naquele período. De acordo com Richard McBrearty, curador-chefe do Museu do Futebol da Escócia, a série talvez devesse se chamar “The Scottish Game”, conforme ele afirmou em entrevista ao jornal Guardian também em março do ano passado.
"Estes jovens jogadores das comunidades da classe trabalhadora da Escócia estavam em grande demanda pelos grandes clubes do norte da Inglaterra, que estavam começando a ganhar proeminência ao sul da fronteira”, afirmou. “O jogo ainda era muito amador, mas todos os tipos de incentivos seriam oferecidos para atraí-los de suas comunidades para o futebol inglês. Sete membros do time vitorioso do Preston North End – o primeiro clube a vencer a liga e a copa em 1888-89 – eram escoceses.”
Aliás, o contexto em que se deu a história de Suter torna o seu legado ainda maior, segundo McAleese. Afinal, as condições de sobrevivência no século 19 eram bem mais desafiadoras que as atuais. “Ele é um homem que fez uma grande diferença, mas sua jornada inteira, nós não podemos sequer começar a entender, era muito difícil de viver”.
Estudos à parte, o trabalho de restauração do túmulo durou “do começo de março até maio, quando o último trabalho foi feito para renivelar o túmulo”. O processo contou com grande contribuição do Blackburn, que pagou pela restauração do local. Jacqueline chegou a receber uma carta do CEO do clube, Steve Waggott, e se manteve em contato com os Rovers durante todo o processo.
“Teve uma certa quantidade de emails entre eu, Brent Stevenson (o responsável pela restauração) e o Blackburn, então todos estavam de acordo como seria, como pareceria e tudo se deu conjuntamente.”
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Jacqueline talvez nem imaginasse que aquele túmulo de mais de um século que fazia parte de seu caminho diário se tornasse algo tão representativo em sua própria história. E por falar em caminho, porque não imaginar que ela vive em um local por onde o próprio Fergus Suter em carne e osso tenha passado?
“Eu acho que Fergus Suter e Martha (esposa dele) teriam vindo aqui (Blackburn Old Cementery) registrar o nome de seus filhos e para registrar a morte da família de Martha e eles teriam certamente passado em frente a minha casa em inúmeras ocasiões para funerais”, refletiu Jacqueline, dizendo que isso pode “parecer bobo” – e não parece. De acordo com ela, o antigo estádio do clube ficava nas proximidades do cemitério.
Assim, por que não imaginar que os caminhos de Jacqueline McAleese e Fergus Suter se cruzaram? Aliás, ainda que não tenha sido de forma contemporânea, seus caminhos de fato cruzaram. E o futebol agradece, ou melhor, não só o futebol.
“Não poderia ser permitido que seu túmulo desaparecesse, não era certo. Não é apenas sobre Fergus Suter, é sobre tudo. E não é apenas sobre futebol, porque futebol une as comunidades.”
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