A importância do técnico no beisebol | Semana MLB
“O que faz um técnico no beisebol? Ele parece não fazer nada, só fica parado olhando e troca os jogadores. Os jogadores que vão lá e arremessam ou rebatem no final. Qual o papel dele na qualidade do time?”
Esse tipo de questionamento é recorrente em transmissões da Major League Baseball. Normal, muita gente no Brasil ainda está se aprofundando no beisebol e não entende as minúcias do jogo. Aí, como o treinador parece que fica parado vendo o jogo -- ao invés de gritando e pulando na beira do gramado --, fica a impressão que ele não faz nada. O fato de que muitas decisões são pautadas por estatísticas também pode passar essa imagem, do sujeito que apenas aplica o que já está pré-definido.
Nada mais longe da realidade. Mas, ao invés de descrever situações aqui, resolvi conversar com Luis Camargo, ex-catcher da seleção brasileira e da italiana, com carreira na liga industrial japonesa e na italiana, onde foi vice-campeão europeu de clubes. Atualmente, é técnico (e jogador) do Diving Ducks Wiener Neustadt, que conquistou o título austríaco. Também foi treinador de seleções austríacas de base. Não é uma entrevista, mas um bate-papo sobre o papel do técnico no beisebol.
Pessoal tem muito a ideia de que técnico participativo, qualquer que seja o esporte, é o que fica na beira do campo gritando, jogando junto. Técnico de beisebol fica mais parado olhando, fazendo gestos que parecem tiques nervosos. Mas quanto dá para dizer que o técnico influi no desempenho de um time?
O técnico de beisebol é mais discreto. Normalmente aparece só quando vai reclamar com o árbitro e acaba sendo expulso, hahaha. E nem isso direito agora, porque tem revisão de replay na Major League.
Mas, falando sério, tudo o que você faz nos treinos influencia o que você faz no campo. E, se o time estiver bem treinado, acaba parecendo que o técnico não participa muito do jogo. Ele fica passando orientações com sinais, ele não diz nada, mas está dizendo muita coisa. E quando os gestos não são tão expressivos é porque o jogador está entendendo o que o técnico quer de acordo com a situação do jogo.
Que tipo de orientação dá para passar?
Ah, coisa como roubo de base, jogadas de toque (bunt), hit and run. São alguns pequenos detalhes ofensivos. Mas, defensivamente, tem muita coisa que a gente trabalha. É muito gesto, número, às vezes palavras. Tem sinal para todo tipo de situação. Por exemplo, eu estou no banco, o shortstop olha para mim e eu passo a mão esquerda na minha orelha. Isso indica que é para fazer um movimento interno para o lado dele. Então, ele fala o número do jogador e o arremessador sabe que é para ficar de olho que o corredor está pensando em roubar a terceira base. Mas, se eu passar a minha mão direita na orelha, não significa nada e é apenas um sinal para despistar.
E isso é a situação de campo, fora a questão da estratégica do jogo.
Exato! Tem o técnico e os auxiliares. A gente fica acompanhando o número de arremessos do time adversário, do nosso, estamos sabendo se as bolas de efeito estão entrando ou não. A gente vê em que contagem o adversário tentou fazer determinada jogada, como roubo de base ou hit and run, em que contagem eles giram o bastão ou ficam esperando. E tudo isso temos de passar para o time, tanto que muitas vezes dá para ver o jogador no banco olhando um tablet para ver o que ele tem de fazer. Tudo isso está na cabeça do técnico, mas ele não passa com gritaria, só com sinais.
Essas são as orientações durante a partida. Mas o técnico também tem um papel importante na hora de se estabelecer uma estratégia para o jogo. Como em qualquer esporte, tem também o “nó tático”, digamos.
Tudo isso é a preparação antes. Estudar o adversário e saber o que você tem na mão.
Deu para ver isso muito bem em como o Alex Cora, do Boston Red Sox, e o Dave Roberts, do Los Angeles Dodgers, trabalharam nesta semana nos playoffs. Os Red Sox tinham um bullpen pior que o Tampa Bay Rays, mas o Cora conseguiu reverter a situação usando dois relievers capazes de dar muitas entradas a seu time -- o Tanner Houck e o Nick Pivetta --, “encurtando” o jogo e permitindo que apenas os arremessadores mais confiáveis do bullpen precisassem entrar. E, assim, conseguiu ganhar dos Rays.
O Roberts tentou dar um nó na hora de escalar o time. Para complicar o Gabe Kapler no jogo 5 contra o San Francisco Giants, colocou relievers destros para as duas primeiras entradas e o abridor de verdade, canhoto, entrou na terceira. Aí, forçou os Giants a escalarem um time com canhotos para pegar os destros, para colocar os destros no meio do jogo e, nas entradas finais, não ter mais canhoto sobrando para entrar.
Sim, e o técnico tem de pensar tudo isso. Vou citar o exemplo meu aqui, como ganhamos a liga austríaca. O time que eu tenho é muito jovem. Entre os arremessadores, são quatro sub-18, um de 23 anos que é o melhor do time e ainda joga de shortstop e um estrangeiro, holandês, de 26 anos. São jogadores jovens, porque a média de idade dos outros times fica entre 28 e 30 anos. Nas finais, como tínhamos bullpen curto pela lesão de um jogador, trouxe os jovens para abrir os jogos, não deixando que nenhum enfrentasse o mesmo rebatedor mais de uma vez. Usava os quatro arremessadores jovens em um jogo e, no dia seguinte, deixava o estrangeiro ficar quantas entradas ele conseguisse para o arremessador de 23 anos fechar nas últimas entradas. Mas, quando viramos a série final para 2 a 1, mudamos a estratégia. Usei um canhoto jovem por 3 entradas, depois coloquei mais um de um reliever e coloquei o fechador para o resto da partida. Ganhamos por 15 a 11, foi um jogo bem ofensivo. Mas funcionou, e eu tinha arremessadores para usar no dia seguinte, que poderia ser o jogo do título.
Pois é. Esses movimentos todos são o equivalente ao que nos outros esportes são os técnicos que decidem colocar o time mais no ataque desde o começo, ou dosar mais no começo para fazer pressão depois, ou fazer um jogo mais paciente.
Com certeza. E não é só em como usar os arremessadores. O técnico também tem de trabalhar as estratégias de ataque, como completar as corridas para ganhar o jogo. Claro, todo mundo treina fundamento, treina para rebater melhor. Mas que tipo de rebatida? E como montar uma sequência delas. Uma coisa que trabalhamos muito nos Diving Ducks foi o toque (bunt), porque o time é jovem e rápido. Várias vezes conseguimos rebatidas de toque. Aí, quando tínhamos corredores em base e víamos que o terceira base se adiantava para pegar nosso toque, mandávamos o rebatedor só ameaçar para os corredores fazerem o roubo de base duplo. Roubamos muita base assim e ficávamos com corredores em posição de anotar o tempo todo. Aí dá para pensar em uma rebatida ou sacrifício.
Aí é o técnico ajudando a criar o estilo de jogo de um time. Quem não está muito acostumado muitas vezes pensa que o beisebol é basicamente uma soma de fundamentos individuais. O arremessador arremessa o melhor que conseguir e o rebatedor rebate o melhor que conseguir, e ganha quem se der melhor nisso. Mas o treinador não está lá só para melhorar a qualidade desses arremessos e rebatidas. Ele também ajuda a definir como isso será feito, quando será feito, e se faz sentido fazer. Não adianta ter um arremessador que força contatos ruins se a defesa falhar muito. Aí é melhor trabalhar para conseguir strikeouts ou melhorar a defesa.
Exatamente. O trabalho do técnico é saber usar as peças corretas para que elas se complementem. No ataque também. Não dá para eu fazer um time que joga com toque ou rebatidas curtas, se não tiver velocidade para roubar base, aproveitar um wild pitch ou avançar duas bases em uma rebatida simples. Porque, nesse caso, vou precisar de um monte de rebatida em sequência para anotar uma corrida. Para fazer tudo isso, precisa de um técnico que enxergue essas oportunidades e analise as estatísticas para orientar o time quando é melhor tentar cada jogada.
O técnico ainda tem de ser um paizão. Porque, no beisebol, os jogadores ficam juntos muito tempo, muito mais do que em qualquer outro esporte. Jogo todo dia, é muito tempo convivendo. O treinador precisa também trabalhar para manter o elenco todo focado e disposto a competir por muito tempo, além de criar um clima de vestiário saudável para que todos se sintam bem dentro daquele ambiente.
É essencial. O melhor técnico do mundo não vai a lugar nenhum se não tiver o grupo na mão. Até porque o grupo, se está na sua mão, te acolhe melhor e fica do seu lado mesmo quando você erra.
Outro fator que faz as pessoas acharem que o técnico de beisebol faz pouco são as estatísticas, né? No beisebol, tem um número indicando a tendência para cada momento do jogo, e muita gente acha que o técnico apenas é o responsável por aplicar essas tendências. Quando se toma uma decisão com base no instinto, sem considerar os números?
Ah, velho, é uma coisa muito de momento. É a diferença de quando eu jogo de catcher e quando eu estou no banco orientando o catcher. Digamos que vamos enfrentar um ótimo rebatedor de bola reta (bola rápida) na parte interna da zona de strike. Então vamos explorar a parte externa, claro. Mas e se, naquele dia, o arremessador não consegue acertar a bola reta externa, só a interna? A estatística diz para não ir para a parte interna, mas não está rolando na externa. Aí, você começa a trabalhar com outro arremesso, tipo o changeup, na parte externa para fazer com que o corpo do rebatedor fique mais condicionado para aquele lado. E aí vai na rápida na interna.
Tem de saber usar o que o arremessador está se sentindo bem em lançar. Não pode ser robotizado, a estatística sai do padrão nessa hora.
Sobre essa mudança de estratégia de arremessos, tem outro fator ainda, né? Não é só se o rebatedor é bom ou ruim em determinado ponto, ou se o arremessador está bem ou não naqueles pontos. É também se o árbitro está reduzindo ou expandindo a zona de strike naqueles lugares.
Sim. E o técnico ainda tem a função de informar a defesa caso haja uma mudança de tendência. Teve um jogo em que o adversário tinha bases lotadas e o terceiro e quarto rebatedores iam para o bastão. Nosso arremessador estava bem com o changeup e a rápida na parte externa. O rebatedor era bom na parte externa, mas mandamos cinco changeups seguidos e depois fomos para a rápida. Ele ficou sem o tempo do giro e foi eliminado. O rebatedor seguinte era bom para puxar a bola, mas a gente pretendia arremessar na parte externa. Demos o sinal para os defensores externos irem mais para o campo oposto. Era contra o que as estatísticas sugeriam e o que eles fariam normalmente, já que o rebatedor puxa a bola, mas a gente ia atacar a parte externa da zona de strike dele e, por isso, a chance de uma rebatida para o campo oposto era maior. E deu certo, a bola voadora caiu na luva do defensor.
Esse tipo de instinto também entra na hora de definir quando manter ou tirar um arremessador. Ou que arremessador usar. Porque cada jogador tem suas estatísticas, mas tem hora que dá para perceber que o cara está em um dia especialmente melhor ou pior que o normal.
É o exemplo do jogo que eu estava falando, de quando nos livramos das bases lotadas. Depois daquilo, íamos para a oitava entrada. Esse é o momento em que usamos nosso fechador, porque a gente usava o fechador sempre para as duas ou três entradas finais. Mas a forma como nosso arremessador tinha se livrado da entrada anterior tinha deixado ele confiante. Estatisticamente era o caso de tirá-lo, mas o jogo era dele. Fez uma ótima oitava entrada e o fechador veio só para a nona.
É difícil jogar contra a estatística, não nego. Mas o técnico tem de jogar com seu instinto. Pode não funcionar, mas às vezes tem de apostar na experiência, no que já vivenciou. Isso conta muito para um técnico, é um diferencial entre ser bom ou não. Não pode ter medo de arriscar, mas arriscar sabendo o que está fazendo.
PROGRAMAÇÃO DE TV*
Sexta, 15/out
21h - Boston Red Sox x Houston Astros, jogo 1 (Fox Sports)
Sábado, 16/out
17h - Boston Red Sox x Houston Astros, jogo 2 (ESPN 2)
21h - Los Angeles Dodgers x Atlanta Braves, jogo 1 (ESPN 2)
Domingo, 17/out
20h30 - Los Angeles Dodgers x Atlanta Braves, jogo 2 (Fox Sports 2)
Segunda, 18/out
21h - Houston Astros x Boston Red Sox, jogo 3 (Fox Sports)
Terça, 19/out**
- Atlanta Braves x Los Angeles Dodgers, jogo 3 (ESPN)
- Houston Astros x Boston Red Sox, jogo 4 (Fox Sports)
Quarta, 20/out**
- Houston Astros x Boston Red Sox, jogo 4 (ESPN 2)
- Atlanta Braves x Los Angeles Dodgers, jogo 4 (Fox Sports)
Quinta, 21/out**
- Atlanta Braves x Los Angeles Dodgers, jogo 5 (Fox Sports)
Sexta, 22/out**
- Boston Red Sox x Houston Astros, jogo 6 (ESPN 2)
Sábado, 23/out**
- Los Angeles Dodgers x Atlanta Braves, jogo 6 (Fox Sports)
- Boston Red Sox x Houston Astros, jogo 7 (ESPN 2)
Domingo, 24/out**
- Los Angeles Dodgers x Atlanta Braves, jogo 7 (ESPN 2)
*Os jogos também estarão disponíveis ao vivo no Star+
** Os horários dos jogos a partir de 19 de outubro ainda não foram definidos e, portanto, também não têm horário confirmado na grade de programação. Mas terão transmissão, não se preocupem
Obs.: Horários de Brasília. Grade sujeita a alteração
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