Juninho Pernambucano e os Setoristas
Acho absolutamente saudável a presença de ex-jogadores, ex-treinadores e ex-árbitros no quadro de comentaristas de todos os meios de comunicação. Eles trazem uma visão complementar àquelas que transmitimos nós, jornalistas. Quem ganha com essa pluralidade é o leitor, o telespectador, o ouvinte, o internauta (ainda se fala assim?). E principalmente ele: o debatedor de padaria.
Poucos jogadores, entretanto, conseguem transformar a experiência em discurso. Os que logram êxito estão bem colocados. Júnior, Alex, Caio, Sálvio Spínola, Zico, Amoroso, Edmundo, Zé Elias, Djalminha. É ótimo ouvir, concordar, discordar, debater com eles.
Um dos melhores é Juninho Pernambucano, um cara com repertório e oratória acima da média desde sempre. Há alguns dias, porém, ao criticar a imprensa no SporTV, Juninho deu umas caneladas, fruto talvez de um desconhecimento dos princípios do Jornalismo.
Juninho citou os “setoristas” como donos de uma função menor no jornalismo esportivo. Muitos deles, segundo o ex-craque, veiculariam notícias para beneficiar interesses de dirigentes com quem mantêm relações espúrias. Toda generalização é perigosa. Não digo que essa locupletação não exista, mas envolve os maus profissionais que, creio, sejam minoria.
Mas eu quero aqui dirigir o foco ao aparente desconhecimento de Juninho em relação à matriz do jornalismo. Ele diz que, se fosse um setorista, ia batalhar para crescer e chegar, por exemplo, à posição de narrador. São funções diferentes, embora uma mesma pessoa possa exercê-las. Não estão em uma mesma “linha evolutiva” da carreira.
A função básica do jornalismo é a de repórter. O repórter é a pedra fundamental da profissão. É ele quem vai até a notícia, atesta sua relevância, apura suas várias facetas, ouve os envolvidos, pesquisa, redige e transmite ao público. Há repórteres valorizadíssimos, que ganham mais que seus próprios chefes. Um excelente repórter pode ser medíocre se deslocado para a função de editor, e assim por diante. O setorista, por definição, é um repórter que cobre determinado setor. Ou seja, um especialista. No futebol, eles são importantíssimos.
Um repórter de economia que seja destacado pela primeira vez para a cobertura diária de um clube de futebol começará com seu universo reduzido. Ele ficará restrito às vozes oficiais, o que é péssimo para o jornalismo.
Uma das definições de notícia de que mais gosto diz que ela “é um fato ou informação de interesse público que alguém não deseja ver publicado” (em geral, quem está no poder). Para ter acesso a essas informações valiosas, portanto, o repórter precisa ir além das fontes oficiais. Precisa cultivar relações, desenvolver os sentidos, encontrar a notícia escondida em detalhes que, para alguns, passam imperceptíveis. Cabe a ele usar essa cesta de “habilidades” para benefício público, e não pessoal.
Esse patrimônio você só acumula com o tempo. Aqui na ESPN, temos ótimos setoristas, repórteres experientes e valorizados, como o querido Eduardo Afonso, que cobre o cotidiano do São Paulo. Edu tem muitas fontes e conquistou o respeito pela sua bela trajetória no jornalismo. Ele usa sua experiência, conhecimento do ambiente, contatos e relações para esmiuçar a notícia e transmiti-la ao fã de esportes. As fontes sabem que ele está a serviço do bom jornalismo, que seus valores são o interesse público e a busca pela verdade. Não será usado por ninguém.
Temos muito a aprender uns com os outros. Pelo que conheço da persona pública de Juninho, duvido que ele repetiria as generalizações se tivesse tido acesso a esta reflexão que proponho aqui.
Fonte: Maurício Barros
Juninho Pernambucano e os Setoristas
COMENTÁRIOS
Use a Conta do Facebook para adicionar um comentário no Facebook Termos de usoe Politica de Privacidade. Seu nome no Facebook, foto e outras informações que você tornou públicas no Facebook aparecerão em seu cometário e poderão ser usadas em uma das plataformas da ESPN. Saiba Mais.