Guardiola passa a ser agora o melhor técnico de futebol de todos os tempos ou ele ainda não é Pelé?
Para muitos, especialmente os mais jovens, Guardiola já é o melhor técnico da história do futebol após o título da Champions League conquistado no último fim de semana com o Manchester City. Para outros tantos, o espanhol já era o maior de todos antes mesmo desta conquista tão esperada pelo endinheirado clube inglês. A temporada 2022/2023 acabou com a seca de 12 anos de Guardiola no principal interclubes europeu e coroou o genial treinador com uma Tríplice Coroa espetacular. Se a final contra a Inter de Milão não foi a oitava maravilha do mundo, os números de Guardiola nesta temporada e em toda sua carreira são enormes.
Eu já venho dizendo há um bom tempo que o
técnico dos Citizens é o mais influente treinador deste século. Isto porque
seus times viraram referência para quase todo mundo, mesmo para quem o critica,
para quem não é fã de seu estilo. Outros grandes técnicos tiveram que arranjar
maneiras de parar as equipes de Guardiola e, sobretudo em pontos corridos, isso
se tornou mesmo algo quase impossível. Em 14 anos de carreira como técnico de
time principal, o cara ganhou simplesmente 11 ligas nacionais. Tal domínio
passa também, claro, pelo poderio das equipes que ele treinava (Barcelona, Bayern de Munique e Manchester City em fase rica), mas é inegável nos clubes o impacto de
Guardiola, sua filosofia e seu conceito de jogo, que vem de seu mentor: Johan
Cruyff.
“Não sabia nada de futebol até conhecer Johan
Cruyff”, afirmou Guardiola em um de seus livros. Em coletiva após o seu terceiro
título da Champions League, respondendo ao companheiro PVC, o mais famoso
treinador da atualidade voltou a falar em Cruyff: “Hoje, há 14 anos, é curioso,
ganhamos o triplete (Trípice Coroa) com o Barcelona, e 14 é o número de Johan
Cruyff.” De Rinus Michels para Cruyff e de Cruyff para Guardiola. Esse bastão do
bom futebol, que passa muito em ter a bola, em roubá-la o mais rápido possível
do adversário, vem sendo cultivado desde os anos 1970 dentro do Barcelona. A
influência do futebol total holandês no Barça é histórica, e Guardiola posa
como a evolução desse tipo de jogo, que encanta muitas pessoas por ter uma
vocação ofensiva.
Em termos de títulos, já não dá para comparar Guardiola com os mestres Michels e Cruyff faz algum tempo. O primeiro marcou época com seleção em Copa do Mundo como treinador, algo que Guardiola ainda não tem no currículo (e talvez não tenha nunca por vontade de dirigir apenas clubes, onde se controla mais o dia a dia, ou será que ele mudou ou está mudando de ideia?). O segundo perdeu o posto de maior treinador da história do Barcelona para seu pupilo (o Dream Team de Cruyff dos anos 1990 está na história, porém foi superado pelo Barça 2009/2010/2011 do espanhol). Épocas diferentes, especialmente no que se refere ao fim do limite de estrangeiros e à transformação de clubes ricos em verdadeiras seleções. Guardiola usufruiu mais de craques e esquadrões, sem dúvida, e bebeu bem na fonte de outros mestres, mas é assim que funciona no esporte e na vida. Os tempos mudam, tudo evolui.
O badalado espanhol não inventou o falso 9, a marcação alta, o recuo de volantes para zagueiros, a pressão pós-perda, a saída de bola com três jogadores, linha de cinco no ataque e mais uma série de coisas. Só que ele tem muito mérito em aproveitar todos esses itens de forma eficiente, bem trabalhada. Alguém pode dizer, como de costume, que ele só faz sucesso porque coloca em prática tudo isso em equipes com grande poder de investimento. Seria de fato mais complicado neste Século 21 conquistar uma Champions League com o Porto ou mesmo uma Conference League com a Roma, alguns dos feitos de José Mourinho, talvez ainda o maior antagonista de Guardiola pelo estilo de jogo. O marrento e vitorioso português abocanhou, até hoje, 26 troféus como treinador, mesmo número de Carlo Ancelotti, outro papa-títulos em diversos países. Guardiola já acumula 35 taças, o que dá uma média de 2,5 conquistas por ano em sua carreira. Falta só um troféu para ele igualar Valeriy Lobanovskyi e três para empatar com Jock Stein e Mircea Lucescu, três nomes históricos da prancheta que dominaram ligas nacionais periféricas na Europa (as de União Soviética, Ucrânia, Escócia, Romênia e Turquia).
Em números absolutos, ninguém venceu mais do que Sir Alex Ferguson. O escocês que mudou a história do Manchester United, rival local do time de Guardiola, tem impressionantes 50 taças conquistadas, 13 delas na tão valorizada Premier League. Faltam muitos títulos para o espanhol alcançar o lendário treinador que venceu títulos europeus até com o Aberdeen. Alex Ferguson também tinha times com natureza ofensiva e foi dominante no campeonato nacional em que hoje reina Pep Guardiola. Já temos uma década sem Ferguson como treinador e há uma clara ameaça para seus recordes (são 16 ligas nacionais para o escocês), uma vez que Guardiola ainda tem contrato relativamente longo com o Manchester City e, se um dia mudar de clube, pode escolher qualquer outro projeto com bastante dinheiro envolvido.
Rinus Michels foi eleito oficialmente pela
Fifa em 1999 o melhor técnico do Século 20. Campeão da Europa com a Holanda e
com o Ajax, pesou muito sua revolução no futebol para ele ser eleito o maior de
todos mesmo tendo perdido a final da Copa de 1974. As ideias do mentor do
Carrossel Holandês e a influência desse time no futebol moderno perduram até
hoje. Poderia dizer, por essa premiação histórica da Fifa e pelo século de
atuação, que Rinus Michels é o 'Pelé dos técnicos' e que Guardiola seria o 'Messi
dos treinadores' (enfim, Pep ganhou uma Champions League sem ter o craque
argentino em sua equipe). Levando em conta tanto os resultados quanto o desempenho,
Guardiola estaria hoje em uma Santíssima Trindade da prancheta com Ferguson e
Michels. Só que Guardiola ainda tem muito chão pela frente e pode tornar no
futuro qualquer discussão sobre quem é maior em algo menor.
Guardiola não é perfeito, tanto que já
cometeu muitos equívocos em jogos de mata-mata quando tinha a melhor equipe,
era o grande favorito. Mas, na média na carreira, ele tem 77,08% de
aproveitamento, só em uma temporada seu time apresentou menos de 70% de
aproveitamento (foi na primeira com o Manchester City, em 2016/2017, com 66,6%
de aproveitamento, dois terços dos pontos disputados, o que já é uma excelente
marca). O genial espanhol precisaria ter sucesso em alguma seleção para ser o
maior de todos indiscutivelmente? Ferguson não precisou disso. Ele precisaria
triunfar em equipe de segundo escalão para ser aclamado como o melhor de todos?
Também acho que não, ele está sempre bem empregado porque ele é a excelência em
pessoa no que faz. Ele poderia muito bem admitir que seu clube é, nos últimos
anos vitoriosos, um time-Estado que soube driblar o fair play financeiro. Isso
não afetaria a sua boa imagem consideravelmente. Ele é muito bem pago e faz por
merecer esse dinheirão todo, e ele sabe qual é a origem da grana.
Pelé virou neste ano, até como homenagem
póstuma, palavra no dicionário, algo realmente justo e diferenciado. Excepcional,
incomparável e único são agora de forma oficial os significados do adjetivo
Pelé. Guardiola, dentre os técnicos, já merece todas essas citações da frase anterior.
Você pode ainda deixá-lo no patamar de Messi 'apenas', mas a fama, a relevância,
a influência, a liderança e os números já são de Pelé. Só que muita gente hoje,
inclusive Guardiola, acha Messi melhor do que Pelé. Então pode escolher um dos
dois gênios para adjetivar Guardiola.
Guardiola passa a ser agora o melhor técnico de futebol de todos os tempos ou ele ainda não é Pelé?
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