Dispensado do Atlético-MG no campo, ele virou pesadelo do Corinthians no futsal

Francisco De Laurentiis e Vladimir Bianchini, do ESPN.com.br
Márcio Damião/Intelli Orlândia
Dieguinho Comemora Gol Intelli Orlandia Liga Futsal
Dieguinho comemora gol pela Intelli/Orlândia

Faltam 9 segundos para o jogo acabar.

Corinthians e Intelli/Orlândia empatam por 1 a 1, e o time do interior paulista precisa desesperadamente de um gol para ir à final da Liga Futsal. Ao "Timão", basta segurar o empate para avançar à decisão do torneio pela primeira vez na história.

Gadeia recupera a bola no meio-campo.

Faltam 8 segundos.

Toque para a direita, pedido de falta, o juiz não dá. A bola volta, Cabreúva domina.

Faltam 4 segundos.

O lançamento vem forte, mas Diego Henrique de Abreu Assis mata do jeito que dá.

Faltam 3 segundos.

Em um lance acrobático, dribla seu marcador.

Faltam 2 segundos.

O tempo para.

Com a bola está Dieguinho, pivô da Intelli.

Nascido em Belo Horizonte, sempre sonhou em ser jogador.

Teve uma grande decepção na carreira, sendo dispensado de seu time de coração no futebol de campo. Encontrou refúgio no futsal, que lhe acolheu após a tristeza.

Falta 1 segundo.

Com um chute forte, o atacante do Orlândia exorciza todos os seus demônios e manda uma bomba para o fundo das redes. Invasão de torcida. Caos em quadra. Intelli classificada. Corinthians mais uma vez eliminado por seu tradicional rival.

Sonho para a equipe grená, pesadelo alvinegro em pleno Parque São Jorge.

Veja imagens da vitória do Orlândia sobre o Corinthians e da invasão de torcedores 

Esse foi o ápice de um dos maiores artilheiros do futsal brasileiro na atualidade. Autor de 30 gols na edição 2015 da Liga Futsal e mais oito em 2014, quando chegou a Orlândia, ele teve que conviver com a rejeição do Atlético-MG, seu time de infância, no futebol de campo antes de virar uma "máquina de gols" nas quadras.

"Ao todo, fiquei sete anos no Galo. Joguei com vários caras que hoje estão em times grandes, como o Werley e o Renan Oliveira. Ao mesmo tempo, jogava também com o Caio [ex-Minas e Jaraguá, hoje no Gazprom-Ugra Yugorsk, da Rússia] no futsal do Minas", recorda o pivô, em entrevista ao ESPN.com.br.

Atleticano "doente", ao ponto de ter se recusado a treinar no Cruzeiro no infantil, Dieguinho também sempre foi fã de futsal, principalmente depois de ver grandes nomes da modalidade, como Manoel Tobias e Falcão, vestirem o manto alvinegro.

Por muitos anos, conciliou os treinos do futebol de campo com o futsal, até que, em 2006, resolveu jogar apenas nos gramados. Franzino, tinha poucas oportunidades, e passava horas fazendo treinamentos físicos, sempre com a esperança de receber uma chance do técnico Enderson Moreira, então comandante da base atleticana.

Até que um dia...

Arquivo Pessoal
Dieguinho Atletico-MG
Dieguinho (dir) nos tempos de Atlético

"Fui chamado junto com o Caio pra jogar uma partida importante de futsal. Perguntei para o Atlético se podia e eles liberaram, tudo normal. Só que o Enderson também coordenava o time de futsal do Colégio Magno de Belo Horizonte, que era o adversário. Ele fez de tudo pra gente não ir jogar, marcou treino em cima da hora, mas fomos na correria e ganhamos de 5 a 3, nós até fizemos gols", relembra. 

Na manhã seguinte, ao chegar ao centro de treinamento do Atlético, veio a surpresa.

"Não tinha nem nosso nome mais, nem pra pegar o uniforme. Eles mandaram a gente embora e disseram que não era pra ter jogado futsal, mesmo com a gente tendo conversado antes", afirma Dieguinho, que, 10 anos depois, dá sua explicação para o que acha que aconteceu na equipe da capital mineira.

"Eles deram essa desculpa, mas na verdade achava que eu e o Caio éramos baixinhos e não iríamos evoluir fisicamente. Não sei se ficaram com raiva porque vencemos aquele jogo de futsal, sei lá, não tem explicação. Sinceramente, nunca entendi até hoje", diz.

Para um atleticano ferrenho, não poderia haver decepção maior do que ser deixado de lado pelo próprio time de coração. Foi o fim do sonho de brilhar nos gramados.

"Cara, foi uma decepção muito grande... O Atlético é o time que eu torço, era meu sonho chegar ao profissional. Todo mundo tem o sonho de jogar no Real Madrid e no Barça, mas eu só queria jogar no Mineirão lotado com a torcida do Galo gritando e incentivando. Infelizmente, não deu certo", lamenta.

Apesar disso, Dieguinho diz que o coração segue batendo forte pelo "Galo".

"Não mudou em nada nossa relação. Acho que hoje eu torço até mais (risos)", sorri.

A redenção

Dispensado no campo, o atacante então apostou todas as suas fichas no salão. Começou no Minas, tradicional clube de Belo Horizonte, que disputa a Liga Futsal e foi vice-campeão do torneio em 2002, e de cara fez sucesso.

Logo em 2007, uma no depois do fim do sonho no Atlético, foi campeão brasileiro juvenil com o Minas, terminando como artilheiro da competição. Na sequência, foi promovido ao adulto e não demorou para chegar à seleção brasileira.

"Quando fui para a seleção foi demais. Via todos os meus ídolos e foi uma alegria imensa dividir a quadra com todos eles. Foi tudo muito rápido. Num dia eu estava sem esperança alguma de nada, no outro estava tabelando com Vinícius, Lenísio, Ciço, Falcão, só fera!", exalta o atleta de 26 anos.

Márcio Damião/Intelli Orlândia
Dieguinho Comemora Gol Intelli Orlandia Liga Futsal
Dieguinho: artilheiro implacável no futsal

O sucesso na cidade natal foi tão grande que, em 2012, o poderoso Dínamo de Moscou, da Rússia, o contratou. Era hora de experimentar a vida no exterior.

"Fui campeão do Mundial de Clubes em cima do Carlos Barbosa, em 2013, e chegamos na final da Uefa Champions League no mesmo ano, mas infelizmente perdemos para o Kairat Almaty, do Cazaquistão. Mas joguei bem pelo Dínamo", recorda.

No final de 2013, Dieguinho foi contratado pela Intelli/Orlândia, outra potência do futsal brasileiro, e se consolidou como um dos principais pivôs do esporte no país. Jogando em um grande elenco, não demorou a se destacar com gols e assistências.

O gol "espírita"

O grande momento veio em 25 de novembro de 2014.

Após empates por 0 a 0 e 1 a 1 pela semifinal, Corinthians e Intelli decidiram quem ia à final da Liga Futsal na prorrogação. O clube da capital abre 1 a 0 e passa a segurar o resultado. Faltando três minutos para o fim, porém, Lukaian empata, colocando fogo no jogo. O "Timão" se segura, pois precisa apenas do empate para avançar.

A um segundo do fim, Dieguinho aparece e resolve.

"Esse gol é um marco na minha carreira, ninguém esquece. Não tem como: aonde eu vou, todos falam disso (risos). É um dos gols mais importantes que eu fiz na carreira, talvez até o mais importante, até pela rivalidade entre os times", comenta.

O gol "espírita" do pivô, porém, acabou causando uma grande confusão. Revoltados com a derrota, os atletas corintianos reclamaram de toque de mão do rival e partiram para cima do árbitro. Houve invasão de torcida e a partida terminou com a polícia em quadra. Hoje, Dieguinho ri de tudo, mas confessa que na hora morreu de medo.

"Quando tirei a camisa e comecei dar a volta na quadra, achei que o time ia estar atrás comemorando comigo. Quando olhei, estava sozinho (risos). A confusão estava armada e estava todo mundo indo pro vestiário. Eu só pensei: 'Meu Deus, o que eu estou fazendo aqui? Vou apanhar sozinho' (risos). Agora eu dou risada, mas na hora foi um desespero, foi a vez que mais passei medo na vida... Arrepia só de pensar!", clama.

O artilheiro, aliás, dedica todos os gols a uma pessoa muito especial.

"O Alê Oliveira [comentarista dos canais ESPN] fala que quem faz gol beija na night, mas no meu caso é diferente (risos). Comigo, é 'quem faz gol, coloca um 'P' na night, porque toda vez que eu faço um gol, dedico para minha noiva, a Priscila [jogadora de vôlei do Sesi], fazendo a letra 'P' com as mãos", declara-se o apaixonado.

Voando em quadra, Dieguinho agora tem como objetivo levar o Orlândia novamente ao lugar mais alto do pódio, após dois anos sendo vice da Liga Futsal (perdeu para o Brasil Kirin/Sorocaba em 2014 e para Carlos Barbosa em 2015). Segundo ele, porém, é preciso estar preparado para todas as surpresas da vida.

Até para, quem sabe, uma volta aos gramados...

"Hoje sou muito realizado no futsal, atingi um nível técnico muito bom. Creio que já acabou minha época no campo... Mas quem sabe surge uma oportunidade, né? Quem sabe até no meu Galo...", sonha, antes de finalizar.

"A gente precisa estar preparado para tudo nessa vida (risos)".

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